AUTORES
Caetano Baptista Neto
Haroldo Arid Soares
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Key words: Oral lichen planus; malignant transformation – oral diseases
Introdução
O líquen plano é uma enfermidade sistêmica que pode acometer o paciente principalmente em dois sítios, pele e boca, ou associação de ambos. É considerada uma doença inflamatória crônica mucocutânea imunologicamente mediada.
O médico britânico James Erasmus Wilson, em 1869, descreveu uma lesão cutânea nomeando-a de líquen plano, lembrando o aspecto do líquen (associação entre algas e fungos) encontrado em rochas e árvores, atribuindo o termo plano pela discreta espessura.
Basicamente há três tipos de líquen plano, a saber: reticular, erosivo / ulcerativo e bolhoso. Essa classificação é aplicada para o sítio bucal, diferentemente o que ocorre na dermatologia. O tipo reticular é o mais comum, já o bolhoso é mais raro. É estimado que 1% da população apresenta o líquen plano cutâneo, já o bucal varia entre 0,1 a 2,2%.
As mulheres são mais acometidas do que os homens, na proporção de 3:2 e ocorre em adultos de meia idade (Neville et al., 1998).
A etiologia ainda permanece uma incógnita, o que se admite é a mediação de fator autoimune que leva à formação das lesões, agora o por quê ocorre este distúrbio autoimune ainda não se sabe. Segundo estudos (Tommasi, 2002) ocorre uma interação entre as células epiteliais e os linfócitos, onde os macrófados e células de Langerhans processam a informação antigênica aos linfócitos T, após um período esses se tornam citotóxicos para os ceratinócitos existentes na camada basal, promovendo assim, as lesões.
Revista da literatura & Discussão
Desde 1978 a Organização Mundial de Saúde (OMS) classificou o líquen plano como sendo uma condição cancerizável, de acordo com Lanfranchi et al. (2003). Cerca de 2 a 3% das lesões tornam-se malignas (Pindborg et al.1997).
Grinspan (1977) já classificava o líquen plano bucal em basicamente dois tipos, típicos e atípicos. O primeiro consistia nas lesões bucais em forma de placa branca com linhas que se intercruzavam lembrando um aspecto de rede, a estas linhas foram denominadas de estrias de Wickham, localizadas geralmente em mucosas jugais bilaterais. As atípicas consistiam em lesões que fugiam dessas descrições, na maioria das vezes erodidas ou ulceradas. Em pele o líquen plano mostra-se através de pápulas violáceas, poligonais, pruriginosas, geralmente localizadas em regiões flexoras, como punhos, cotovelo, joelho, entre outras (Regezi & Sciubba, 2000).
Neville et al. (1998) afirmam que o líquen plano reticular normalmente não causa sintomas, reservando esta propriedade para o erosivo o que, segundo os autores, seria a explicação para inúmeros trabalhos publicados. O aspecto emocional é controverso, pois existem estudos que apontam dissociação entre estresse e a formação da lesão, entretanto pode ser que para um indivíduo o estresse seja suficiente para desencadear a doença e para outro não.
Soto-Araya et al. (2004) estudaram 34 pacientes com lesões em mucosas bucais, desses 18 possuiam ulcerações aftosas recorrentes, 9 eram portadores de líquen plano bucal e 7 apresentavam síndrome da ardência bucal. O objetivo do estudo era avaliar a relação dessas enfermidades com estados emocionais perturbados. Verificaram que as ulcerações aftosas e o líquen plano tinham íntima relação com ansiedade e estresse emocional, já a síndrome da ardência bucal associava-se com estados depressivos. O fator psicológico parece ser forte nessas doenças ligadas à imunidade, concluíram.
Tommasi (2002) relaciona a doença com o vírus da hepatite C, pois portadores de líquen plano apresentaram em exames sorológicos (PCR-Polimerase Chain Reaction) o vírus da hepatite C nas células epiteliais das lesões de líquen. Segundo o autor o tipo erosivo é o que apresenta maior potencial para transformação maligna para carcinoma espinocelular.
A seleção de corticosteróides para tratamento do líquen plano é unânime para a maioria dos autores, já a forma de aplicação ainda traz algumas variantes. O uso tópico vem ganhando terreno para o arsenal terapêutico, como demonstra o trabalho de Carbone et al. (2003) comparando as duas formas de abordagem, onde concluiu que os benefícios da terapia sistêmica são semelhantes da tópica. O medicamento sistêmico eleito foi a prednisona e o clobetasol para o uso local. O grupo que utilizou a prednisona obteve melhora completa em 66,2% dos casos, já o tratamento tópico com clobetasol apresentou melhora de 69,6%. Além de ser eficaz a terapia tópica não apresenta efeitos colaterais, concluíram.
Hodgson et al. (2003) estudaram 50 pacientes adultos com líquen plano erosivo ou ulcerativo com sintoma de ardor e irritação, para sua pesquisa utilizaram corticóide tópico, no caso, pomada a 1% de tacrolimus aplicadas duas vezes ao dia entre 2 a 40 meses, dependendo de cada caso. Observaram melhora total em 14% dos casos, em 80% houve melhora parcial com redução dos sintomas e remissão clínica. Exames bioquímicos para avaliação da função hepática e renal foram realizados e não apresentaram alterações.
Gonzales-Moles et al. (2003) utilizaram para lesões gengivais do líquen plano creme Orabase de propionato de clobetasol a 0,05%, em 100% dos casos onde havia dor houve remissão completa e não foram observados efeitos colaterais.
Edwards & Kelsch (2002) afirmaram que os corticosteróides tópicos são indicados para líquen planos reticulares e erosivos, entretanto para lesões recidivantes do líquen ou cuja manifestação clínica esteja exacerbada é aconselhável a terapia sistêmica.
Além dos cremes e pomadas Orabase os colutórios de corticosteróides podem ser usados para enxágües diários. Como demonstraram Gonzalez-Moles et al. (2002) em 30 pacientes com bochechos de clobetasol, desses 93% obtiveram melhora na dor e manifestação, 5 pacientes apresentaram efeitos colaterais tais como, face edemaciada (face em lua cheia) e hirsutismo (aumento da espessura e número de pelos), entre a quarta e sexta semana de tratamento com reversão rápida após diminuição da freqüência dos bochechos.
Conjuntamente a ministração de corticosteróides é fundamental o acompanhamento clínico para avaliar as lesões propriamente ditas, bem como a ocorrência de possíveis doenças oportunistas, tais como as candidoses. A resposta imunológica local em um regime corticoterápico pode ser inibida, para tal é relevante o uso de drogas antifúngicas como o miconazol para prevenir ou tratar tais afecções, como relatado nos trabalhos de Carrozzo & Gandolfo (1999) e Carbone et al. (1999).
Caso Clínico
Paciente N. M. T. do sexo feminino, 58 anos de idade, leucoderma, brasileira natural de São Paulo, apresentou-se na clínica de especialização em Estomatologia da Universidade Metropolitana de Santos (Unimes) com queixa de ardência na língua e mucosas bucais, com duração de aproximadamente 1 ano. Durante a anamnese pudemos avaliar que seu estado emocional era compatível com ansiedade e foi relatada preocupação em relação à natureza de seu problema. Nos antecedentes mórbidos referiu ter contraído hepatite há cerca de 16 anos, portadora de talassemia controlada e história de mioma. Negou tabagismo e etilismo. No exame físico geral a mesma apresentou pressão arterial de 170/90 mmHg., pulso de 90 bpm, eupnéica (freqüência respiratória dentro da normalidade: 16 respirações por minuto), e sem alterações de tegumento em membros superiores.
No exame físico regional extrabucal a paciente não apresentou qualquer alteração significativa, a não ser pelo fácies preocupante. Frente ao exame intrabucal pudemos encontrar em mucosa jugal direita e esquerda placas brancas estriadas intercruzantes (estrias de Wickham) com presença de halo eritematoso, estas se estendiam desde a região de trígono retro-molar até o sítio retrocomissural limitadas inferiormente pelo fundo de sulco e superiormente pela papila parotídea (figura 1). Em soalho bucal foram observadas placas brancas similares, que acometiam a porção póstero-anterior esquerda (figura 2). Em língua também foram encontradas discretas placas em borda lateral direita (Figura 3). Em todas as alterações descritas havia sintoma de ardor ou queimação, que eram agravados frente à substâncias cítricas, ácidas e picantes.
Diagnóstico
Tendo em vista os aspectos clínicos característicos, o diagnóstico clínico foi de líquen plano reticular, este confirmado pelo anátomo-patológico obtido através da biópsia incisional em mucosa jugal no local de maior manifestação clínica da lesão, abrangendo área clinicamente sadia e placa branca estriada.
Conduta terapêutica
A orientação para afastar-se de agentes irritantes de mucosa é fundamental para que não haja maior prejuízo ou exacerbação dos sintomas indesejados, substâncias alcoólicas (bebidas e bochechos), sucos cítricos e temperos devem ser evitados (Sonis; Fazio & Fang, 1996). A tranqüilização da paciente é importante para que seja excluída a existência de doenças malignas, pois o incremento da ansiedade e estresse psicológico serve para o agravamento e ocorrência de recidivas. Muitas vezes o apoio por um psiquiatra ou psicólogo é indicado.
De acordo com a revisão de literatura a droga de escolha para doenças autoimune pertence ao grupo dos corticosteróides, estes podem ser ministrados sistemicamente, ou de uso tópico, ou concomitantemente. Para o caso relatado foi eleita a terapia tópica, tendo em vista que as lesões do líquen plano sitiavam apenas a cavidade bucal, portanto, de envolvimento mucoso exclusivamente. Optamos pelo elixir de betametasona, com enxágües de 5ml por pelo menos 1 minuto, 4 vezes ao dia durante 14 dias. Após o período prescrito a paciente retornou com significativa melhora, tanto no sintoma quanto na manifestação clínica, havendo remissão total das lesões (figuras 4 e 5). A paciente não apresentou qualquer reação adversa.
O controle deve ser instituído, em um primeiro momento quinzenal, para posteriormente mensal, bimestral e assim por diante, dependendo da cada caso e condições emocionais do paciente.
Conclusões
O presente trabalho permitiu concluir que:
· O líquen plano apresenta um componente psicológico significativo, o seu reconhecimento durante a anamnese é fundamental para a suspeita diagnóstica e auxilio no tratamento.
· O elixir de betametasona pode ser indicado como terapia tópica para o líquen plano, sendo outra opção no arsenal terapêutico.
· Para manifestações clínicas graves, recidivantes, ou fracasso na terapia tópica, deve ser instituído a córticoterapia sistêmica para o líquen plano. Associação com antimicóticos são indicados para terapia a longo prazo.
Publicado: Revista da APCD de São Caetano do Sul - Espelho Clínico - Ano VIII, Nº44, p. 11-13, Jun 2004.
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Um comentário:
oi tudo bom gostei muito do artigo,pois me ajudou a entender um pouco mais sobre oliquen plano.o meu irmao teve o liquen plano fez otratamento e desapareçeram os sitomas ,mas com sete meses depois repetio novamente,primeiro nas maos, pes, braços e o que nos preocupou mais foi as lesoes na boca, em forma de bolhas e em seguida se trasformaram em linhas brancas.com o tratamento esta como bom,mas tenho medo de que possa volta novamente, o que devemos faser para que ela nao volte?
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